É assim que pesquisadores de Stanford estão projetando vasos sanguíneos para imprimir corações humanos em 3D

Corações humanos podem ser impressos? Sim. E podem funcionar normalmente? Bem… essa é a grande questão. Uma nova descoberta da Universidade Stanford promete resolver esse obstáculo.

A lista de espera para transplantes de órgãos é enorme, e muitas pessoas passam anos esperando. Além disso, mesmo que um órgão adequado seja encontrado, o corpo pode rejeitá-lo. Por isso, os cientistas buscam uma solução incrível: criar novos órgãos a partir das próprias células. Isso eliminaria o risco de rejeição e as longas esperas.

Um dos maiores desafios na fabricação de órgãos a partir das células do próprio paciente é garantir que o órgão sobreviva. E para isso, é preciso mais do que apenas formato: é preciso um sistema vascular que leve oxigênio e nutrientes a todos os cantos do tecido.

O problema é que cada órgão possui uma rede de vasos sanguíneos (a “vasculatura”) incrivelmente complexa e única, que precisa ser impressa perfeitamente para que o órgão funcione e sobreviva. Por exemplo, não há dois corações com a mesma rede de vasos. Até agora, projetar e “imprimir” esses sistemas complexos para um órgão inteiro com uma impressora 3D tem sido quase impossível ou extremamente demorado.

No entanto, agora há esperança. Um grupo de pesquisadores da Universidade Stanford desenvolveu uma ferramenta que permite o design e a modelagem de árvores vasculares com um nível de precisão, realismo e velocidade nunca antes alcançados. A descoberta, publicada na revista Science, abre caminho para levar a bioimpressão de órgãos a um novo patamar.

A rede que dá vida

Quando o coração bate, o sangue percorre um mapa de vasos cada vez mais finos que se ramificam em escala microscópica. Em tecidos complexos como o coração, existem mais de 2.500 capilares em um milímetro cúbico. Para que cada célula receba o que precisa, ela precisa estar a uma distância de 100 a 150 micrômetros do vaso mais próximo. Um sistema vascular deficiente significa que as células simplesmente não conseguem sobreviver.

É aí que entra o novo algoritmo desenvolvido pela equipe liderada pela bioengenheira Alison Marsden. Com ele, eles conseguiram reduzir o tempo necessário para modelar uma rede vascular completa para um coração humano de vários meses para apenas cinco horas. Eles explicaram que o design resultante inclui um milhão de vasos interconectados, com cobertura suficiente para alimentar todas as células do tecido.

software, chamado SimVascular, é de código aberto, o que significa que qualquer laboratório no mundo pode usá-lo, melhorá-lo ou adaptá-lo aos seus próprios projetos.

O sistema não é apenas rápido: também é realista. Ele utiliza simulações de dinâmica de fluidos para garantir que o sangue (ou um fluido contendo oxigênio e nutrientes) circule como faria em um corpo humano. Também evita colisões entre vasos, gera vias fechadas com apenas uma entrada e saída e permite que o design seja adaptado a formas anatômicas complexas.

E a impressão?

É claro que projetar a rede é apenas parte do processo. Ainda não existe uma bioimpressora capaz de replicar com precisão os milhões de vasos projetados no modelo completo. Mas conseguiram imprimir versões mais simples: uma rede com 500 ramificações e uma menor, que foi usada para um teste crucial.

vasos sanguíneos
A complexidade reside na capacidade de representar o complexo sistema vascular do corpo humano

Utilizando uma impressora que funciona com células vivas, eles criaram um anel de tecido com células renais humanas embrionárias. Através dele, imprimiram uma rede de 25 vasos pelos quais circulavam fluido oxigenado. O resultado: uma grande proporção das células foi mantida viva por esse fluxo artificial.

Embora as impressoras 3D atuais não consigam imprimir todos esses milhões de minúsculos vasos de uma só vez, eles conseguiram imprimir um modelo com 500 ramificações e demonstraram que ele poderia manter as células ao redor vivas, bombeando-as com fluidos contendo nutrientes e oxigênio.

“Mostramos que esses vasos podem ser projetados, impressos e manter as células vivas”, explicou Mark Skylar-Scott, outro líder da equipe. “Ainda estamos longe de imprimir um órgão completo, mas agora temos o processo que torna isso possível”, disse.

O coração em construção

Este desenvolvimento não é apenas um feito técnico: representa um passo fundamental rumo à possibilidade de fabricar órgãos humanos funcionais e personalizados. Especificamente:

  • Ela resolve um gargalo de longa data: a vasculatura. Agora, os pesquisadores podem planejar como alimentar cada canto de um órgão impresso, o que é essencial para evitar que o tecido morra rapidamente.
  • Acelera a pesquisa: o novo algoritmo permite gerar em horas o que antes levava meses. Isso abre caminho para mais experimentação, falhas mais rápidas e melhor aprendizado sobre como escalar esses modelos para órgãos inteiros.
  • Aproximando a medicina personalizada: embora esses canais impressos ainda não sejam vasos sanguíneos funcionais — eles ainda não possuem células musculares e revestimentos celulares — eles são um primeiro passo sólido para alcançar redes vasculares tão complexas quanto as do corpo humano.

O que falta para que tudo isso se transforme em um coração pulsante fora do corpo? A equipe de Stanford já está trabalhando nos próximos passos. Um dos desafios é transformar esses canais impressos em vasos sanguíneos verdadeiramente funcionais: não apenas estruturas ocas, mas condutos vivos, completos com células musculares, revestimentos celulares e tudo o mais necessário para fazê-los funcionar como os do corpo humano. Eles também buscam aprimorar a precisão e a velocidade das bioimpressoras, que ainda não são capazes de imprimir as densas redes necessárias para um órgão completo.

Artigo relacionado Coração humano em porcos; cérebro humano em camundongos: o futuro da medicina já começou

Coração humano em porcos; cérebro humano em camundongos: o futuro da medicina já começou

Outra questão em aberto é mais biológica do que técnica: estimular o crescimento natural dos menores capilares, aqueles que nenhuma impressora consegue reproduzir, mas que são essenciais para nutrir os tecidos. E, por fim, o aspecto mais ambicioso permanece: integrar tudo — células e vasculatura — em escala real. Porque o objetivo não é apenas imprimir peças. É construir, célula por célula, um coração humano completo, feito sob medida e pronto para bater.

Referência da notícia

Zachary A. Sexton et al. ,Rapid model-guided design of organ-scale synthetic vasculature for biomanufacturing. Science (2025).

Facebook
Twitter
WhatsApp

Leia Também